|:| Corpus Compartilhado Diacrônico: cartas pessoais brasileiras |:| Célia Lopes {celiar.s.lopes@gmail.com} e Silvia Cavalcante {silviare@gmail.com} |:| carta 42-AA-13-02-1911 |:| Autor: Eurico Land Avellar |:| Destinatário: Alarico Land Avellar |:| Data: |:| Versão modernizada |:| Encoding: UTF-8 São Paulo , 13 de Fevereiro de 1911 Prezado irmão , Estimarei que esta encontre a ti e todos os nossos de perfeita saúde . Há 3 dias recebi uma lacônica carta de Damião , dizendo que Papai tinha acabado com o negócio , que estavam como Deus queria , e enfim uma porção de coisas que nada absolutamente adiantavam ao caso . Esperei que Papai ou você me escrevessem alguma coisa dando pormenores sobre a casa , porém como até hoje tal não aconteceu e estou no mesmo estado de incerteza e aflições , apresso-me em escrever-te esta afim de que com a urgência que a gravidade do caso requer , me escrevas informando detalhadamente como vão as coisas e principalmente me informes dos seguintes pontos capitais para se poder tomar qualquer providência : 1º Como se deu o fechamento da casa ? 2ºEste fechamento foi espontâneo ou coagido por algum credor ? 3º Neste caso quem é o credor e qual a importância que este tem a haver ? 4º Tem a firma dinheiro a receber , quanto , e de quem ? 5º Quem ficou encarregado da liquidação da firma ? 6º Tem a firma algum credor particular por empréstimo etc ? Quem é e por quanto é credor ? 7º Existem lançamentos nos livros , reconhecendo [pag] estes créditos ? Há documentos , letras , notas promissórias ou qualquer . obrigações assinadas pela firma ? Faço tantas perguntas pois só depois da inint. isto pode se tomar alguma deliberação acertada . Estou quase certo que você é bem capaz de ignorar tudo assim , pois Papai ] ultimamente tem adotado o sistema de nada dizer e entregar-se , sem um único movimento de energia , inteiramente ao que der e vier . Se ele ainda nada te disse urge que você o interpele sobre estes pontos pois Mamãe e todos nós podemos estar illudidos e vermos eles de um momento para outro ficarem sem uma cama para dormir , o que será evitável se nós pudermos chegar a tempo de salvar alguma coisa . Peço-te igualmente tirar da cabeça de Mamãe estas desastrada ideia de sair de Petrópolis para meter-se em lugar estranho , onde não são conhecidos e onde a vida lhes custará o dobro . Igualmente não devem ter ilusões sobre a conta de Papai daqui por diante , ele , digamos com profundo pezar , é um homem vencido pelo desânimo , e nada , absolutamente nada fará no sentido de remediar o mal . É a perfeita reprodução de vovô do Japão , reprodução que todos nós devemos olhar com pavor . Portanto qualquer idéia de sair de Petrópolis e meter-se no Rio e arranjar emprego para ele é fora de todo o cabimento . [pag] Falo assim porque suponho que não haja fato de gravidade tal que os obrigue a mudar de Petrópolis . Seria o mesmo que assasiná-lo , pois tenho certeza que ele não resistirá ao desgosto de perder todas as distrações que tem aí etc . Além disto a mudança de clima seria prejudicial a todos eles . E onde Chuchinha poderia ganhar no Rio , o que ganha em Petrópolis , fazendo as mesmas despesas que tem aí ? Creio que estou arriscando opiniões demais , pois ignoro tudo , porém se as coisas estão no pé que julgo , está tudo muito bem e até considero uma felicidade o fato do fechamento do armazém , sorvedouro material e fonte de desgosto para todos aí . Logo que receber resposta tua informando-me detalhadamente do que há , farei um sacrifício e irei aí verificar de inint. as condições em que se poderia acomodar a situação deles . A minha ideia basea-se no seguinte : Nos catarmos todos os que tiverem dinheiro , isto é eu , você , Chinha o Guimba e com alguma coisa que eles tivessem ou que pudessem vender comprar aí no lugar mais conveniente possível uma casa com terreno , onde eles possam descansados passar o resto da vida , vivendo com os \ ganhos que fizerem de plantas , ovos , trabalhos etc , \ e com as mesadas que cada um de nós concorreria . Papai não perderia as plantas que afinal [pag] de contas são o seu único pensamento e que não lhe dão prejuízo , e representam um capital que vendendo , por muito que apurasse não daria para compensar o seu desgosto . O que é preciso é me escreveres logo , pois irei aí e faremos o que for necessário , pois se nós não dermos providências tudo ficará como até aqui até a miséria venha lhes partir a porta , o que será vergonhoso para você e para mim como filhos mais velhos que somos e por conseguinte responsáveis pelo que se der no futuro , se não tomarmos agora medidas que a situação exige . Creio que tendo uma casa própria , ainda mesmo que fiquem devendo alguma coisa sobre a casa , a despesa não excederá de 500$ mensais , o que não será difícil apenas com as nossas quotas e os ganhos de flores , trabalhos etc . O que é impossível é continuar numa casa de 200$ e do tamanho da que estão , obrigando a ter mais criados etc para a limpeza etc . Tenho um palpite de que Vovó é a vitima do negócio , se for assim e se os outros herdeiros calarem a boca e deixarem correr tudo a revelia , será tudo muito bom . Espero resposta urgente , pois estou em inint. para comprar a Filial do Isnard aqui e caso não se chegue a uma conclusão creio que me estabelecerei por própria com auxílio de um capitalista desta e em combinação com o Contevilla e pouco tempo terei depois para perder . Sem mais , aceite um abraço do irmão e amigo Eurico